• Paulo Freire: o revolucionário educador (Programa 1 e 2)
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    O exercício de tornar-se capaz de ler ou escrever exige de quem realmente aprende uma postura de sujeito que cria o seu próprio aprendizado.
  • Palestra de Paulo Freire aos estudantes universitários
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    A gente vem sendo condicionado a separar a compreensão do mundo da compreensão da palavra, da compreensão do texto. O que vale dizer a gente vem sendo treinado, na educação formal da gente, a separar a compreensão do texto da compreensão do contexto em que o texto se gera. Então isso é um negócio terrível também. É outro desses mistérios de separar os inseparáveis. Então a gente lê os textos sem nenhuma conexão ou até se fosse bonito mesmo ler o texto de um autor sem ter ideia nenhuma do contexto histórico, social, político, ideológico, cultural do autor. Quer dizer, a gente lê Gramsci como se tivesse nascido em Caruaru ano passado. Ano passado não podia porque não teria escrito. Mas, há 30 anos atrás. Não dá, não é possível isso. Quer dizer, a gente tem que ler o texto e contextualizá-lo. Então a contextualização do texto é um sine qua non pra mim pra compreensão do texto. Daí a dificuldade ou daí o maior trabalho que a leitura exige do leitor. Quer dizer, o leitor deve, ao ler um texto brigar por se informar em torno do contexto, e quando eu digo contexto eu digo contexto no sentido amplo dessa palavra incluindo tempo e espaço e não apenas espaço do autor. Quer dizer, quando eu digo contexto eu falo da história e da geografia ou da geografia que se fez história do autor. E quando o texto é de um autor estrangeiro a exigência maior para nós se faz em que a gente deveria ter uma noção do texto, do contexto histórico, social, político do autor do texto e mais, estabelecer uma relação entre esse texto, o contexto do autor com o nosso contexto de leitor. E a falta, as vezes, disso nos leva a incompreensões tremendas.
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    Então, consultar dicionário é tarefa indispensável de quem lê. A primeira coisa que a gente tem que fazer é arrebentar com essa preguiça de que eu falava. É como se, por exemplo, abrir o dicionário aqui e passar dez minutos consultando o dicionário me fizesse perder o tempo que eu não vou, inclusive, dedicar à leitura. (...) eu sempre digo aos estudantes com quem trabalho, custa muito caro, possivelmente vocês não podem ter em casa, uma bateria de dicionários importantes. Então, procure a universidade e se a universidade não tiver, exige da biblioteca que compre. Então um dicionário normal, comum da Língua Portuguesa, esse é o primeiro que tem que ser consultado, mas esse não basta. Porque o dicionário, afinal de contas, registra a palavra quase sempre imobilizada nele. Então, tem que ultrapassar. Às vezes a gente resolve, satisfaz. Mas é preciso então ir mais além do dicionário que registra. É preciso pegar, por exemplo, um dicionário que eu acho de uma importância enorme que é o dicionário etimológico, por exemplo. Porque as vezes sabendo a etimologia da palavra a gente avança fantasticamente para compreender o que tá dito lá. Mas é preciso também um dicionário filosófico, por exemplo, é preciso pegar a palavra, e um dicionário filosófico vai mais além do dicionário que registra, imobilizadamente a compreensão da palavra.
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    E acho que escrever, em primeiro lugar não se separa de ler, e é uma coisa muito gostosa escrever. Segundo lugar é uma coisa muito difícil. Não é fácil escrever, escrever implica em um certo artesanato, implica uma paciente impaciência de procurar, implica um trabalho de busca, mas sobretudo, pra mim, implica a busca permanente de um momento de boniteza ao qual é preciso dar atenção. Quer dizer, a gente tem o dever até de testar do ponto de vista do ouvido da gente, da vista da gente, a forma que a gente está dando para ver qual é a menos feia, portanto qual é a mais gostosa. E isso, na Língua Portuguesa, por exemplo, a colocação dos pronomes, os meus, seus, te, os me. Esses pronomezinhos não se colocam ao gosto irreverente da gente, eles obedecem a um certo ritmo estético da linguagem, essa coisa existe, não é invencionisse. Eu só não sugiro que vocês obedeçam aos gramáticos, mas aos bons escritores sim. Por isso, então é que eu acho e eu sempre pus isso como uma condição pra trabalhar comigo, quando eu tinha estudantes escrevendo dissertação, é que qualquer que seja o tema dissertação, pra trabalhar comigo o estudante deveria ler pelo menos um livro de Machado de Assis, deveria ler mais de um livro de Graciliano Ramos, deveria ler Manoel Bandeira, deveria ler Carlos Drummond de Andrade, deveria ler Gilberto Freyre, não enquanto sociólogo, mas enquanto estilista. Gilberto Freyre pra mim é um dos maiores escritores de Língua Portuguesa, um dos maiores do ponto de vista do gosto, do bom gosto. E gente que tá escrevendo tese deve conviver com autores que escreveram e escrevem gostosamente. Quer dizer, a questão de quem escreve um trabalho está na seriedade com que escreve, na seriedade com que trata o tema, na rigorosidade com que trata o tema. Segundo, está também na forma elegante, bonita com que fala do que tratou. Essa história de dizer que só quem se preocupa com a boniteza da fala é poeta e não cientista é incompetência do cientista. Quando um cientista diz isso a mim eu o considero absolutamente incapaz, isso é incapacidade dele ou dela, é limitação. Eu digo sempre, o senhor escreve feio porque não sabe escrever bonito e não gosta de escrever bonito, o senhor tem mau gosto. Então, se tem mau gosto fique com ele, mas não transforme o mau gosto em dogma. Pelo contrário eu acho que se dogma pudesse haver seria o da boniteza, se pudesse haver um dogma seria o de que nós temos o dever de ficar bonitos e quando eu digo bonitos eu não tô me referindo a... eu mesmo perderia qualquer concurso de boniteza
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